Entenda mais sobre o aniversário mais famoso do mundo
Luciana Alvarez
Do UOL, em São Paulo
Do UOL, em São Paulo
- Visita dos reis magos ao menino Jesus também é questionada por estudiosos
Bilhões de pessoas em todo mundo celebram hoje o aniversário de Jesus Cristo. A verdade, entretanto, é que ele não nasceu num dia 25 de dezembro.
"A teoria mais forte atualmente é que a data tenha sido escolhida para
se contrapor à principal festa religiosa dos romanos, do Sol Invencível,
que se dava na noite do dia 24", afirma Valeriano Santos Costa, diretor
da faculdade de Teologia da PUC-SP. Na data, os romanos celebravam o
solstício de inverno, quando acontecia a noite mais longa do ano.
E não para por aí. O ano de nascimento de Jesus, que marca o
início da contagem do nosso calendário - afinal, estamos a caminho do
ano 2013 "depois de Cristo" - provavelmente está errado. "Os
evangelhos não fornecem datas precisas, apenas indícios. E muitas
variáveis devem ser consideradas, como a diferença de calendários
adotados por judeus e romanos à época", afirma o historiador Julio Cesar
Chaves, mestre em Ciências da Religião e pesquisador do cristianismo
primitivo. "Tanto Lucas quanto Mateus relatam que Jesus nasceu durante o
reinado de Herodes, o que provavelmente situaria o nascimento entre os
anos 6 e 4 a.C. (antes de Cristo)", diz.
Segundo a tradição cristã, Maria teria dado à luz em Belém. Mas o local
também é contestado por alguns estudiosos, como o teólogo americano
John Dominic Crossan e o arqueólogo israelense Aviram Oshri. Belém, que
fica na Judeia, é citada nos evangelhos de Lucas e Mateus, mas os especialistas dizem haver indicações de que ele teria nascido na Galileia,
onde começou a pregar. O fato de ambos evangelhos situarem o nascimento
em Belém é visto como uma tentativa de associar Jesus à profecia de
Miqueias, segundo quem o messias esperado pelos judeus nasceria naquela
cidade.
Se nem data e local de nascimento estão livres de controvérsia,
tampouco as imagens reproduzidas nos presépios mundo afora, com o
menino na manjedoura recebendo a visita dos três reis magos, são
encaradas por estudiosos como realidade. "As narrativas sobre o
nascimento foram feitas três ou quatro gerações depois, quando as
informações históricas e os testemunhos diretos já estavam perdidos",
diz André Chevitarese, professor do Instituto de História da
Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), um dos autores do livro
"Jesus Histórico. Uma Brevíssima Introdução", da Klíne Editora. "O
relato tem uma discussão de poder, de reis importantes vindo de longe
prestar homenagem", completa.
Sem detalhes claros sobre o nascimento de Cristo, há quem duvide de sua
existência. Na opinião dos especialistas, entretanto, essas correntes
apresentam mais motivações ideológicas do que históricas, uma vez que há, sim, provas da existência da Jesus.
"Ele é tão histórico quanto o imperador Tibério, ou a maioria dos
imperadores romanos. Se você vai colocar Jesus como ficção, tem que
colocar boa parte da história antiga na linha da ficção. Do que não se
tem provas científicas é de que ele seja o salvador. Aí entra a questão
da fé", afirma Costa.
"A quantidade de fontes antigas de períodos praticamente contemporâneos
a Jesus que o mencionam é considerável - inclusive em obras não
cristãs. Não faria sentido pensar que uma quantidade tão grande de
fontes compostas quase ao mesmo tempo e por autores diferentes fizesse
referência a uma pessoa que nunca existiu, ou que fosse fruto de uma
invenção", diz Chaves. Segundo ele, a ideia segundo a qual Jesus seria
uma invenção mítica surgiu por volta do século 18, e nenhum estudioso
sério defende tal tese. "A quantidade de fontes antigas que mencionam
Julio César, por exemplo, é muito menor do que as que mencionam Jesus.
No entanto, nunca vi ninguém questionar a existência do primeiro",
completa.
A mais recente pesquisa sobre a vida de Jesus
trata de um fragmento de papiro traduzido do copta - idioma usado por
cristãos no Egito antigo - pela professora da Escola de Teologia de
Harvard Karen King e cita Jesus dizendo "minha mulher". A própria
historiadora reconhece que o documento, escrito cerca de quatro séculos
após a morte de Cristo segundo suas estimativas, não prova que ele fosse
casado, apenas que cristãos dos primeiros séculos acreditavam nisso. "E
ninguém sabe ao certo se esse papiro é real ou uma farsa", ressalta
Costa.
Estudar a vida de Cristo é um tema polêmico pois envolve não só
ciência, mas fé. Para Chevitarese, jamais existirá um retrato único
dele. "É como um caleidoscópio. Existem inúmeros retratos de Jesus: no
evangelho de João, Jesus é Deus; para Paulo, ele é o messias, mas não
Deus. No fundo, Jesus é uma percepção de cada comunidade", conclui.
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