O
ano de 2012 foi sombrio para o Direito Penal em geral e para o campo
dos direitos fundamentais em particular. A avaliação é de advogados
criminalistas e estudiosos do sistema penal brasileiro ao comentar o artigo publicado pelo advogado Márcio Thomaz Bastos na revista Consultor Jurídico,
em que Bastos faz um “balanço crítico” das práticas penais neste ano
no país. O advogado alertou para o recuo dos direitos fundamentais em
razão de “uma vaga repressiva que embala a sociedade brasileira".
O artigo de Márcio Thomaz Bastos foi citado pela Folha de S. Paulo desta quarta-feira (26/12). A Folha destacou as observações do advogado quanto à prevalência do "sentimento de desprezo pelos direitos e garantias fundamentais" frente à logica de facilitação das condenações sob a justificativa de se fazer Justiça.
Para advogado criminalista Leônidas Scholz, conselheiro do Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD) e membro do Conselho de Prerrogativas da OAB-SP, o artigo publicado pela ConJur alerta para uma tendência preocupante nas práticas penais no Brasil. “Com ponderação e objetividade, o texto faz um alerta a respeito dessa inclinação para facilitar condenações”, avalia Scholz. “Tendência essa confirmada pela Suprema Corte do país. É grave”, lamenta.
O advogado Jair Jaloreto, especialista em crimes financeiros e de lavagem de dinheiro, também admite que, em 2012, foi consolidado o recuo de garantias fundamentais no campo da persecução penal. “Entendo que principalmente no julgamento da Ação Penal 470 [o processo do mensalão] houve uma relativização do princípio da presunção de inocência”, avaliou. "E penso que alguns julgadores, não só no STF, mas também em instâncias inferiores, se preocuparam demais com a opinião pública no desempenho da persecução penal, o que é muito perigoso”, disse.
Jaloreto também observou a dificuldade da opinião pública em diferenciar a figura do advogado da do seu cliente e de entender que o direito à defesa é intocável. “Houve episódios em que ocorreu a pré-condenação do advogado, como no caso do próprio Dr. Márcio Thomaz Bastos, atacado por assumir a defesa do Carlinhos Cachoeira”, recordou Jaloreto.
O professor de Direito Penal da Faculdade de Direito da Fundação Armando Alvares Penteado (FAAP) Filipe Schimidt Fialdini disse que o ano de 2012, encabeçado pelas condenações do julgamento do mensalão, foi marcado não só pelo enfraquecimento do direito de defesa, mas de outros princípios caros às garantias fundamentais. “Foram desconsiderados vários princípios, como a própria presunção de inocência e mesmo a ideia de contraditório, além de ter se dado maior valor a provas produzidas meramente em delegacias”, disse Fialdini.
“Foi um ano de populismos. Um ano em que se enfraqueceu o princípio da presunção de inocência em favor da ideia de se punir políticos e figurões. O Direito Penal, porém, não tem o papel de servir de veículo para enfraquecer garantias individuais”, observou. “O Direito Penal não serve para justificar atos de vingança, mas justamente também para assegurar os direitos individuais.
Infelizmente, as pessoas não se dão conta disso até serem acusadas e julgadas. Não quero nem pensar como serão os próximos anos. Penso naquele juiz de primeiro grau que já seguia nessa direção, agora então endossado pelo Supremo Tribunal Federal, a situação ficou muito complicada”, disse Fialdini.
Tendência global
“É um movimento mundial, não ocorre somente no Brasil”, observa o advogado e professor Luiz Flávio Gomes sobre o fenômeno do cerceamento do direito defesa em todo o mundo. Para Gomes, com o aumento da violência em nível global e em razão do decorrente cenário de complexidade em todo o mundo, que aumenta a sensação de insegurança e incerteza, a opinião pública passou a ansiar por “respostas imediatas” que, não raro, “atropelam as garantias fundamentais conquistadas pelo Estado de Direito”.
“[O artigo] faz um balanço equilibrado desse fenômeno. É feliz em sua síntese do preocupante quadro em que vivemos de crecescente cerceamento do direito de defesa. Tome como exemplo a decisão da Corte Europeia de Direitos Humanos, que reconheceu que, na França, advogados são obrigados a delatar seus clientes caso suspeitem que ele estejam envolvidos com lavagem de dinheiro”, lembrou o professor.
Gomes lança em janeiro o livro “Populismo Penal Midiático”, pela editora Saraiva, que aborda justamente o cenário em que “juízes cedem cada vez mais frente ao atropelo de direitos e garantias”.
“No julgamento do mensalão, que foi um "telejulgamento, tivemos a figura do “telerrelator” e a do “telerrevisor”, que falavam diretamente à opinião pública. E essa influência da mídia é com frequência negativa”, avaliou. “O mundo jurídico tem que dar uma resposta a esse fenômreno sob pena de assistirmos a um grave recuo dos direitos fundamentais”, alertou. Gomes disse ainda que a tendência favorável às condenações pode ser verificada no fenômeno do "aumento das penas", muitas vezes discrepantes em relação ao crime julgado.
O artigo de Thomaz Bastos reconheceu que, este ano, o Direito Penal sofreu um retrocesso no sentido das teses que prevaleceram, na visão do advogado criminalista David Rechulski . “O princípio constitucional do in dubio pro reo, que prevalece em qualquer país civilizado, não pode ser relativizado ou fragilizado. Pois, à medida que isso acontece, ocorre a quebra da segurança jurídica. A pena que atinge a um inocente perturba de modo muito mais grave a ordem social do que a eventual não-responsabilização de alguém que tenha potencialmente cometido um crime”, disse Rechulski.
Para o advogado o princípio do in dubio pro reu não pode ser posto em segundo plano nem mesmo em relação ao “interesse da maioria”. “É um princípio sacrossanto do Direito Penal. Nada deve se sobrepor a ele”, postulou.
O artigo de Márcio Thomaz Bastos foi citado pela Folha de S. Paulo desta quarta-feira (26/12). A Folha destacou as observações do advogado quanto à prevalência do "sentimento de desprezo pelos direitos e garantias fundamentais" frente à logica de facilitação das condenações sob a justificativa de se fazer Justiça.
Para advogado criminalista Leônidas Scholz, conselheiro do Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD) e membro do Conselho de Prerrogativas da OAB-SP, o artigo publicado pela ConJur alerta para uma tendência preocupante nas práticas penais no Brasil. “Com ponderação e objetividade, o texto faz um alerta a respeito dessa inclinação para facilitar condenações”, avalia Scholz. “Tendência essa confirmada pela Suprema Corte do país. É grave”, lamenta.
O advogado Jair Jaloreto, especialista em crimes financeiros e de lavagem de dinheiro, também admite que, em 2012, foi consolidado o recuo de garantias fundamentais no campo da persecução penal. “Entendo que principalmente no julgamento da Ação Penal 470 [o processo do mensalão] houve uma relativização do princípio da presunção de inocência”, avaliou. "E penso que alguns julgadores, não só no STF, mas também em instâncias inferiores, se preocuparam demais com a opinião pública no desempenho da persecução penal, o que é muito perigoso”, disse.
Jaloreto também observou a dificuldade da opinião pública em diferenciar a figura do advogado da do seu cliente e de entender que o direito à defesa é intocável. “Houve episódios em que ocorreu a pré-condenação do advogado, como no caso do próprio Dr. Márcio Thomaz Bastos, atacado por assumir a defesa do Carlinhos Cachoeira”, recordou Jaloreto.
O professor de Direito Penal da Faculdade de Direito da Fundação Armando Alvares Penteado (FAAP) Filipe Schimidt Fialdini disse que o ano de 2012, encabeçado pelas condenações do julgamento do mensalão, foi marcado não só pelo enfraquecimento do direito de defesa, mas de outros princípios caros às garantias fundamentais. “Foram desconsiderados vários princípios, como a própria presunção de inocência e mesmo a ideia de contraditório, além de ter se dado maior valor a provas produzidas meramente em delegacias”, disse Fialdini.
“Foi um ano de populismos. Um ano em que se enfraqueceu o princípio da presunção de inocência em favor da ideia de se punir políticos e figurões. O Direito Penal, porém, não tem o papel de servir de veículo para enfraquecer garantias individuais”, observou. “O Direito Penal não serve para justificar atos de vingança, mas justamente também para assegurar os direitos individuais.
Infelizmente, as pessoas não se dão conta disso até serem acusadas e julgadas. Não quero nem pensar como serão os próximos anos. Penso naquele juiz de primeiro grau que já seguia nessa direção, agora então endossado pelo Supremo Tribunal Federal, a situação ficou muito complicada”, disse Fialdini.
Tendência global
“É um movimento mundial, não ocorre somente no Brasil”, observa o advogado e professor Luiz Flávio Gomes sobre o fenômeno do cerceamento do direito defesa em todo o mundo. Para Gomes, com o aumento da violência em nível global e em razão do decorrente cenário de complexidade em todo o mundo, que aumenta a sensação de insegurança e incerteza, a opinião pública passou a ansiar por “respostas imediatas” que, não raro, “atropelam as garantias fundamentais conquistadas pelo Estado de Direito”.
“[O artigo] faz um balanço equilibrado desse fenômeno. É feliz em sua síntese do preocupante quadro em que vivemos de crecescente cerceamento do direito de defesa. Tome como exemplo a decisão da Corte Europeia de Direitos Humanos, que reconheceu que, na França, advogados são obrigados a delatar seus clientes caso suspeitem que ele estejam envolvidos com lavagem de dinheiro”, lembrou o professor.
Gomes lança em janeiro o livro “Populismo Penal Midiático”, pela editora Saraiva, que aborda justamente o cenário em que “juízes cedem cada vez mais frente ao atropelo de direitos e garantias”.
“No julgamento do mensalão, que foi um "telejulgamento, tivemos a figura do “telerrelator” e a do “telerrevisor”, que falavam diretamente à opinião pública. E essa influência da mídia é com frequência negativa”, avaliou. “O mundo jurídico tem que dar uma resposta a esse fenômreno sob pena de assistirmos a um grave recuo dos direitos fundamentais”, alertou. Gomes disse ainda que a tendência favorável às condenações pode ser verificada no fenômeno do "aumento das penas", muitas vezes discrepantes em relação ao crime julgado.
O artigo de Thomaz Bastos reconheceu que, este ano, o Direito Penal sofreu um retrocesso no sentido das teses que prevaleceram, na visão do advogado criminalista David Rechulski . “O princípio constitucional do in dubio pro reo, que prevalece em qualquer país civilizado, não pode ser relativizado ou fragilizado. Pois, à medida que isso acontece, ocorre a quebra da segurança jurídica. A pena que atinge a um inocente perturba de modo muito mais grave a ordem social do que a eventual não-responsabilização de alguém que tenha potencialmente cometido um crime”, disse Rechulski.
Para o advogado o princípio do in dubio pro reu não pode ser posto em segundo plano nem mesmo em relação ao “interesse da maioria”. “É um princípio sacrossanto do Direito Penal. Nada deve se sobrepor a ele”, postulou.
Rafael Baliardo é repórter da revista Consultor Jurídico em Brasília.
Nota do blog: Concordo que houve sim, influenciado pela mídia e pelo populismo, relativa mitigação de normas princípios, fragilizando direitos fundamentais conquistados ao longo de séculos por todo o mundo, preocupando o cientista do direito.
Nota do blog: Concordo que houve sim, influenciado pela mídia e pelo populismo, relativa mitigação de normas princípios, fragilizando direitos fundamentais conquistados ao longo de séculos por todo o mundo, preocupando o cientista do direito.
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