EDUARDO BRESCIANI E RICARDO BRITO - O Estado de S.Paulo
BRASÍLIA - Com um debate intenso em plenário, o Supremo
Tribunal Federal encaminhou ontem sua decisão para decretar a perda de
mandato dos deputados condenados no processo do mensalão. A sessão foi
interrompida com um empate por 4 a 4, mas o ministro Celso de Mello deu
sinais claros em suas intervenções de que, na sessão de amanhã, vai
acompanhar o entendimento de que o STF pode dar a palavra final sobre o
tema e determinar a cassação dos mandatos.
Assim, a perda seria comunicada à Câmara pelo Supremo após a
conclusão da fase de recursos, cabendo à Casa apenas confirmar a
sentença do Judiciário. Essa posição deve provocar conflito com o
Legislativo, que entende ter a palavra final.
Os deputados João Paulo Cunha (PT-SP), Pedro Henry (PP-MT) e Valdemar
Costa Neto (PR-SP) são os parlamentares atingidos pela decisão do
Supremo. No início do ano, o ex-presidente do PT José Genoino engrossa a
lista, uma vez que deve assumir a cadeira na Câmara ocupada por
Carlinhos Almeida (PT), prefeito eleito de São José dos Campos (SP)
(leia mais na pág. A10).
O relator do processo e presidente do Supremo, Joaquim Barbosa,
argumentou que a gravidade dos crimes cometidos e as condenações
impostas são "absolutamente incompatíveis e inconciliáveis" com o
exercício de mandato no Congresso. "Causa espécie, desconforto, dizermos
ao Congresso Nacional que uma pessoa condenada a 10, 12, 15 anos (de
prisão) possa exercer um mandato parlamentar."
A posição de Barbosa foi acompanhada por Luiz Fux, Gilmar Mendes e
Marco Aurélio Mello. Nos debates realizados na tarde de ontem, Celso de
Mello fez algumas intervenções reforçando argumentos dos colegas que
votaram pela decretação da perda do mandato.
Em uma dessas falas, observou que um dos efeitos da condenação é a
suspensão dos direitos políticos e, neste caso, a Constituição não prevê
qualquer deliberação posterior do Congresso sobre a retirada dos
parlamentares da função. Celso de Mello chegou a citar precedentes da
época do Império para defender seus argumentos. Apesar dessas
manifestações, porém, o voto ainda não foi colhido porque Barbosa
encerrou a sessão com quatro votos para cada proposta.
'Guardiões'. Como vem ocorrendo ao longo dos quatro meses de
julgamento, o contraponto a Barbosa é capitaneado pelo revisor do
processo, ministro Ricardo Lewandowski. Ontem, ele afirmou que, mesmo o
STF discordando da Constituição, não poderia dar uma decisão contrária
ao texto. "Somos guardiões da Constituição, e não censores do
constituinte", disse. Para ele, os parlamentares foram eleitos de forma
legítima e somente podem deixar o cargo por decisão do próprio
Legislativo. Lewandowski ressalvou ter a certeza de que "a Câmara saberá
avaliar a gravidade do caso". "Nós somos supremos dentro deste poder,
mas não estamos acima de outros poderes", afirmou.
O entendimento do revisor foi acompanhado ontem por Rosa Weber, Dias
Toffoli e Cármen Lúcia. O voto mais longo foi o de Rosa. Ela afirmou que
"bons motivos" como o "combate à corrupção" não podem servir para se
retirar atribuições de outro Poder. "Em uma época em que muito se fala
em crise de representatividade e em déficit de legitimidade, parece
tentadora interpretação constitucional que subtraia do Poder Legislativo
suas atribuições", disse. "Mas a democracia representativa não pode ser
tratada como conceito abstrato."
Rosa Weber sustentou que o mandato não é um direito individual, mas
dos eleitores que escolheram o parlamentar para representá-los, só
podendo, portanto, ser retirado por decisão do próprio Legislativo.
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