Extraído de: Associação do Ministério Público de Minas Gerais - 11 de Outubro de 2012
Celso de Mello aponta 'utilização criminosa do aparelho de Estado', e Dirceu é condenado por 8 votos a 2
BRASÍLIA
O Supremo Tribunal Federal (STF) confirmou ontem a condenação por
corrupção ativa do núcleo político do mensalão, formado pelo ex-ministro
da Casa Civil José Dirceu, pelo ex-presidente do PT José Genoino e pelo
ex-tesoureiro petista Delúbio Soares. Ontem, votaram o presidente da
Corte, Ayres Britto, e Celso de Mello.
Os dois aproveitaram seus
votos para refutar as críticas de que o STF não estaria conduzindo o
julgamento de forma justa e imparcial. Para ambos, o processo está
repleto de provas de que Dirceu era o chefe do esquema. Dirceu acabou
condenado por 8 votos a 2; Genoino, por 9 a 1; e Delúbio, pela
unanimidade dos ministros. Também foram condenados pelo mesmo crime
Marcos Valério e outros quatro réus ligados a ele.
Para Celso de
Mello, não há como aceitar o argumento das defesas de Dirceu e Genoino
de que ambos estavam só fazendo política, e não corrompendo deputados.
Segundo ele, os dois usaram a estrutura do governo para cometer crimes:
-
Nem se diga que os réus, notadamente Dirceu e Genoino, limitaram-se a
desenvolver atividades políticas, o que tornava necessários os contatos
frequentemente mantidos com políticos e dirigentes partidários. O
diálogo institucional não autoriza a utilização criminosa do aparelho de
Estado e a utilização ilícita do aparato governamental em ordem a
viabilizar a consecução de objetivos inconfessáveis de práticas
delituosas que transgridem a legislação penal do Estado.
Ayres Britto ressaltou que Dirceu era o homem forte do governo Lula e tinha como tarefa montar a base:
-
À medida que prosseguia nas respostas às perguntas da magistrada que o
interrogava, ele (Dirceu) foi deixando claro que era de fato o
primeiro-ministro do governo. Tudo passava pelas mãos dele. Ele foi
coordenador da campanha, foi o comandante da transição. No governo que
se instaurou, ele foi o chefe da Casa Civil, mas era plenipotenciário.
Ele dizia: "Eu me reunia com praticamente todos os partidos para formar a
base". (...) E, no caso, a Suprema Corte assentou que as alianças foram
feitas argentariamente.
Para Ayres Britto, o chamado núcleo político não tinha projeto de governo, mas de poder:
-
Com a velha, matreira e renitente inspiração patrimonialista, um
projeto de poder foi arquitetado. Não de governo, porque projeto de
governo é lícito, mas um projeto de poder que vai muito além de um
quadriênio quadruplicado, muito mais de continuidade administrativa. É
continuísmo governamental. Golpe, portanto, nesse conteúdo da
democracia, que é o republicanismo, que postula renovação dos quadros de
dirigentes.
Segundo Celso de Mello, os corruptores eram
"dirigentes capazes de perpetrar delitos infamantes", "arrogantes" e
tinham "senso de impunibilidade". Também disse que os "agentes
perpetradores das práticas criminosas" não tinham escrúpulos, tinham
"avidez pelo poder", e agiram sem "integridade, honra, decência e
respeito aos valores da República". Celso também ressaltou que as
migrações de deputados para partidos da base, aliada em troca de
pagamento de propina do valerioduto, foram "grave desvio
ético-político".
Ayres Britto ressaltou que a formação de
alianças entre os partidos é natural na política brasileira. O problema é
a forma como o PT fez isso:
- O que é estranhável neste caso é a
formação argentária, pecuniarizada de alianças. É um estilo de coalizão
excomungado pela Justiça brasileira. É lamentável, catastrófico que
partidos foram açambarcados por um deles para uma aliança perene,
indeterminada no tempo, no sentido de votar todo e qualquer projeto de
interesse do partido hegemônico.
Assim como Cármen Lúcia no dia
anterior, Celso de Mello disse ontem que o STF não estava julgando a
história de vida dos réus, mas as acusações do Ministério Público
Federal. Para ele, há provas suficientes para justificar a condenação
dos réus por corrupção ativa:
- Tenho por inadmissível e
desconstituída de consistência a afirmação de que este processo busca
condenar a atividade política, busca condenar réus pelo só fato de
haverem sido importantes figuras políticas ou haverem desempenhado papel
de relevo na vida partidária, na cena política ou nos quadros
governamentais. Ao contrário, condenam-se tais réus porque existe prova
juridicamente idônea a revelar e demonstrar que tais acusados agiram de
acordo com uma agenda criminosa muito bem articulada, valendo-se para
tanto de sua força, do seu prestígio e de seu inquestionável poder sobre
o aparelho governamental e sobre o aparato partidário da agremiação a
que estavam vinculados.
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