Críticas ao Ministério Público
Após duas semanas ausente, o advogado Cassius Haddad está de volta ao Twitter e ao Facebook. O Tribunal de Justiça de São Paulo mudou parcialmente
a decisão da 2ª Vara Criminal de Limeira, que o impedia de acessar
qualquer rede social. Na sentença de 1ª instância, foi definido que os
provedores enviassem relatórios periódicos dos acessos de Haddad e que
ele próprio se apresentasse à Justiça mensalmente para detalhar sua
atividade na internet. A restrição havia sido fixada após um pedido do
promotor Luiz Bevilacqua, do Ministério Público de São Paulo, criticado
por Haddad nas redes sociais.
“Era uma decisão que nos remetia à Idade Média. Isso prejudica meus clientes, com quem me relaciono pela internet”, critica o advogado, que segue proibido de mencionar o MP ou o promotor Bevilacqua nas redes sociais. O pedido de Habeas Corpus no TJ-SP foi da Federação das Associações dos Advogados do Estado de São Paulo (Fadesp), representada por seu presidente Raimundo Hermes Barbosa e o advogado Herick Berger Leopoldo.
O Sindicato dos Advogados do Interior Paulista (Sindadv) também entrou com um Mandado de Segurança contra a sentença de 1ª instância, que ainda não foi analisado. “É absurdo ter o direito à expressão cerceado. O Facebook hoje também é uma ferramenta de trabalho”, afirma Paulo Ortega, presidente da entidade, que ainda levou a reclamação ao Conselho Nacional de Justiça.
Querelas virtuais
Em seus perfis no Facebook e no Twitter, Haddad faz várias críticas à atuação do Ministério Público e de Luiz Bevilacqua, que atua na região de Limeira. Suas postagens na rede se queixam principalmente da omissão do MP às suspeitas de corrupção relacionadas a um shopping na cidade.
Insatisfeito com a atuação de Bevilacqua no cargo público, ele enviou uma denúncia contra o promotor ao Conselho Nacional do Ministério Público. Na representação, o advogado aponta a ineficiência do MP ao combater casos de corrupção e irregularidades na administração pública. O advogado também lamenta as dificuldades de diálogo com o órgão. Uma reclamação também foi enviada ao Juizado Especial Cível da Comarca de Limeira (SP).
Em fevereiro de 2013, foi deferido um pedido cível de antecipação de tutela feito pelo advogado Thiago Vinícius Treinta, que defende o promotor. Haddad não atendeu à solicitação da Justiça, que determinava a retirada do conteúdo ofensivo em 24 horas sob pena de multa diária de R$ 1 mil. Como a permanência das postagens na internet, o promotor recorreu a uma representação criminal. “Era um ataque sem direito à defesa. Diferente das páginas pessoais comuns, havia poucas fotografias ou comentários de amigos, mas diversas acusações. A internet era a ferramenta do crime”, argumenta Treinta.
No mês seguinte, o Órgão Especial do Colégio de Procuradores aprovou uma moção de desagravo em favor de Bevilacqua e contra a campanha difamatória na internet. No evento de apoio, que reuniu 250 representantes do MP e do Judiciário, o procurador-geral de Justiça, Márcio Elias Rosa, defendeu a livre manifestação de pensamento com responsabilidade.
“Minha atuação profissional incomoda alguns órgãos na cidade”, comenta Haddad, que atuas nas áreas de Direito Empresarial e de licitações. Já Thiago Treinta acredita que a implicância contra o promotor pode ser explicada por um conflito de interesses. “O advogado representa políticos e empresários que se prejudicaram com ações do Ministério Público”, conta. Procurado pela revista eletrônica Consultor Jurídico, o promotor não se manifestou sobre o caso.
Usuário inativo
Na ação contra Haddad, eram contadas dez ofensas ao artigo 138 (calúnia), 24 ao artigo 139 (difamação) e 7 ao artigo 140 (injúria) do Código Penal entre 8 de janeiro e 21 de março de 2013. Por se tratar de crime contra funcionário público, como estabelece o artigo 141 do mesmo código, as penas aumentam em um terço. Também era reivindicado no processo o concurso material, ou seja, a aplicação cumulativa das sanções.
Em decisão cautelar, o juiz Henrique Alves Correa, da 2ª Vara Criminal de Limeira, vetou o acesso de Haddad a “todas as redes sociais da internet, em especial as seguintes: Facebook, Twitter, Orkut, MySpace, Flixster, Linkedin, Tagged etc, pois os comentários depreciativos estão sendo feitos através da Internet (circunstâncias relacionadas ao fato), devendo o denunciado permanecer distante desses locais para evitar o risco de novas infrações”. Em caso de descumprimento, poderia ser pedida a prisão preventiva.
Os provedores e sites de relacionamento — como Google, Twitter e Facebook — oram oficiados para enviar um relatório mensal das contas e perfis de Cassius Haddad. O réu também foi obrigado, em conformidade com o artigo 319 do Código de Processo Penal, a comparecer em juízo para descrever suas atividades na internet.
Silêncio quebrado
Com o entendimento de que o caso de Haddad era de interesse para a categoria, a Fadesp pediu Habeas Corpus para mudar o resultado de 1ª instância. Na contestação, a entidade apontou incoerência entre a sentença da 2ª Vara Criminal de Limeira e o pedido do Ministério Público, o que configura julgamento extra petita. “Não foi requerido pelo denunciante ao juízo que adotasse medida cautelar proibindo o paciente de ter acesso às redes sociais da internet”, afirma.
A Fadesp também alegou que a privação total do uso das redes viola as garantias individuais previstas pela Constituição. Além da liberdade de expressão, resguardada pelo artigo 5º, a Carta Magna estabelece ausência de restrições à manifestação de pensamento em seu 220º artigo. Também haveria, segundo Haddad, desrespeito à jurisprudência sobre o assunto no Supremo Tribunal Federal e à Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948.
Além do constrangimento e da ilegitimidade da medida cautelar para a situação, a Fadesp ressaltou a prerrogativa do réu de se eximir da culpa até que a sentença penal condenatória transite em julgado. “Vale ressaltar que, a decisão judicial questionada antecipa uma punição (pena restritiva de direito) mais severa que eventual condenação do paciente pelo crime mais grave imputado a ele nos autos (crime de calúnia)”, aponta.
A 14ª Câmara do Direito Criminal do TJ-SP aceitou parcialmente os argumentos e liberou o acesso de Haddad às redes sociais, para garantia do exercício da profissão. Segundo o desembargador Marco de Lorenzi, que relatou o caso, a medida restritiva mais gravosa “extrapola o escopo de proteção do bem jurídico tutelado”. Na mesma linha de pensamento, ele também julgou desnecessário o comparecimento mensal em juízo. A menção ao Ministério Público ou a Luiz Bevilacqua nas redes sociais continua vedada.
Em sua primeira postagem no retorno ao Facebook, Cassius Haddad postou trechos do hino nacional. O advogado Thiago Vinícius Treinta informou que por enquanto não pretende entrar com outra ação na Justiça.
“Era uma decisão que nos remetia à Idade Média. Isso prejudica meus clientes, com quem me relaciono pela internet”, critica o advogado, que segue proibido de mencionar o MP ou o promotor Bevilacqua nas redes sociais. O pedido de Habeas Corpus no TJ-SP foi da Federação das Associações dos Advogados do Estado de São Paulo (Fadesp), representada por seu presidente Raimundo Hermes Barbosa e o advogado Herick Berger Leopoldo.
O Sindicato dos Advogados do Interior Paulista (Sindadv) também entrou com um Mandado de Segurança contra a sentença de 1ª instância, que ainda não foi analisado. “É absurdo ter o direito à expressão cerceado. O Facebook hoje também é uma ferramenta de trabalho”, afirma Paulo Ortega, presidente da entidade, que ainda levou a reclamação ao Conselho Nacional de Justiça.
Querelas virtuais
Em seus perfis no Facebook e no Twitter, Haddad faz várias críticas à atuação do Ministério Público e de Luiz Bevilacqua, que atua na região de Limeira. Suas postagens na rede se queixam principalmente da omissão do MP às suspeitas de corrupção relacionadas a um shopping na cidade.
Insatisfeito com a atuação de Bevilacqua no cargo público, ele enviou uma denúncia contra o promotor ao Conselho Nacional do Ministério Público. Na representação, o advogado aponta a ineficiência do MP ao combater casos de corrupção e irregularidades na administração pública. O advogado também lamenta as dificuldades de diálogo com o órgão. Uma reclamação também foi enviada ao Juizado Especial Cível da Comarca de Limeira (SP).
Em fevereiro de 2013, foi deferido um pedido cível de antecipação de tutela feito pelo advogado Thiago Vinícius Treinta, que defende o promotor. Haddad não atendeu à solicitação da Justiça, que determinava a retirada do conteúdo ofensivo em 24 horas sob pena de multa diária de R$ 1 mil. Como a permanência das postagens na internet, o promotor recorreu a uma representação criminal. “Era um ataque sem direito à defesa. Diferente das páginas pessoais comuns, havia poucas fotografias ou comentários de amigos, mas diversas acusações. A internet era a ferramenta do crime”, argumenta Treinta.
No mês seguinte, o Órgão Especial do Colégio de Procuradores aprovou uma moção de desagravo em favor de Bevilacqua e contra a campanha difamatória na internet. No evento de apoio, que reuniu 250 representantes do MP e do Judiciário, o procurador-geral de Justiça, Márcio Elias Rosa, defendeu a livre manifestação de pensamento com responsabilidade.
“Minha atuação profissional incomoda alguns órgãos na cidade”, comenta Haddad, que atuas nas áreas de Direito Empresarial e de licitações. Já Thiago Treinta acredita que a implicância contra o promotor pode ser explicada por um conflito de interesses. “O advogado representa políticos e empresários que se prejudicaram com ações do Ministério Público”, conta. Procurado pela revista eletrônica Consultor Jurídico, o promotor não se manifestou sobre o caso.
Usuário inativo
Na ação contra Haddad, eram contadas dez ofensas ao artigo 138 (calúnia), 24 ao artigo 139 (difamação) e 7 ao artigo 140 (injúria) do Código Penal entre 8 de janeiro e 21 de março de 2013. Por se tratar de crime contra funcionário público, como estabelece o artigo 141 do mesmo código, as penas aumentam em um terço. Também era reivindicado no processo o concurso material, ou seja, a aplicação cumulativa das sanções.
Em decisão cautelar, o juiz Henrique Alves Correa, da 2ª Vara Criminal de Limeira, vetou o acesso de Haddad a “todas as redes sociais da internet, em especial as seguintes: Facebook, Twitter, Orkut, MySpace, Flixster, Linkedin, Tagged etc, pois os comentários depreciativos estão sendo feitos através da Internet (circunstâncias relacionadas ao fato), devendo o denunciado permanecer distante desses locais para evitar o risco de novas infrações”. Em caso de descumprimento, poderia ser pedida a prisão preventiva.
Os provedores e sites de relacionamento — como Google, Twitter e Facebook — oram oficiados para enviar um relatório mensal das contas e perfis de Cassius Haddad. O réu também foi obrigado, em conformidade com o artigo 319 do Código de Processo Penal, a comparecer em juízo para descrever suas atividades na internet.
Silêncio quebrado
Com o entendimento de que o caso de Haddad era de interesse para a categoria, a Fadesp pediu Habeas Corpus para mudar o resultado de 1ª instância. Na contestação, a entidade apontou incoerência entre a sentença da 2ª Vara Criminal de Limeira e o pedido do Ministério Público, o que configura julgamento extra petita. “Não foi requerido pelo denunciante ao juízo que adotasse medida cautelar proibindo o paciente de ter acesso às redes sociais da internet”, afirma.
A Fadesp também alegou que a privação total do uso das redes viola as garantias individuais previstas pela Constituição. Além da liberdade de expressão, resguardada pelo artigo 5º, a Carta Magna estabelece ausência de restrições à manifestação de pensamento em seu 220º artigo. Também haveria, segundo Haddad, desrespeito à jurisprudência sobre o assunto no Supremo Tribunal Federal e à Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948.
Além do constrangimento e da ilegitimidade da medida cautelar para a situação, a Fadesp ressaltou a prerrogativa do réu de se eximir da culpa até que a sentença penal condenatória transite em julgado. “Vale ressaltar que, a decisão judicial questionada antecipa uma punição (pena restritiva de direito) mais severa que eventual condenação do paciente pelo crime mais grave imputado a ele nos autos (crime de calúnia)”, aponta.
A 14ª Câmara do Direito Criminal do TJ-SP aceitou parcialmente os argumentos e liberou o acesso de Haddad às redes sociais, para garantia do exercício da profissão. Segundo o desembargador Marco de Lorenzi, que relatou o caso, a medida restritiva mais gravosa “extrapola o escopo de proteção do bem jurídico tutelado”. Na mesma linha de pensamento, ele também julgou desnecessário o comparecimento mensal em juízo. A menção ao Ministério Público ou a Luiz Bevilacqua nas redes sociais continua vedada.
Em sua primeira postagem no retorno ao Facebook, Cassius Haddad postou trechos do hino nacional. O advogado Thiago Vinícius Treinta informou que por enquanto não pretende entrar com outra ação na Justiça.
Victor Vieira é repórter da revista Consultor Jurídico.
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