domingo, 4 de dezembro de 2011

O pescador de aviú e o grande causídico

Miguel Oliveira 

Editor-Chefe 

Antes de vir para o trabalho, segunda-feira, fui chamado à porta de minha casa por um conhecido vendedor de aviú, me oferecendo, como sempre, essa miniatura de crustáceo que só o nosso caboclo sabe apreciar seu requintado sabor. 
Ao atravessar a rua, deparei-me, por acaso, com uma reluzente Hillux, prateada, novinha em folha. Logo o vidro da porta se abriu e de lá veio aquela voz inconfundível:

- E aí, Miguel, queres carona?
Como não dirijo carro, aceitei na hora a gentileza do advogado José Ronaldo Dias Campos, ele mesmo, de carne e osso, que acabara de fazer um pequeno rancho no mercadinho da esquina.
Ao ingressar no interior do veículo, desejei-lhe parabéns por ter adquirido aquela 'máquina'.
-Parabéns, Zé Ronaldo, pelo carro novo. Fico feliz com o sucesso dos meus amigos, afirmei para puxar conversa.
Mas Zé Ronaldo só fez sorrir e atalhou a conversa:
- Tenho lido tuas crônicas, disse o advogado.
Antes de responder e agradecer ao leitor fiel, me veio na cabeça à figura do vendedor de aviú que há instantes estava na porta da minha casa e uma reminiscência de meu tempo de morador da margem do rio Tapajós, no bairro da Prainha.
- Pois Zé, a próxima crônica eu vou dedicar a ti, respondi.
- Tu vais me esculhambar? Questionou Zé Ronaldo. - Olha lá...
Poucos sabem que o grande causídico José Ronaldo Dias Campos foi um exímio pescador de aviú na infância, assim como eu e meu irmão Airton.
Certa vez, quando o aviú estava em piracema, subindo rio, margeando seu leito, nosso quintal na rua do Imperador ficava 'cheio' e era um refúgio momentâneo para o crustáceo se esconder dos ataques do tucunaré. Nessa época, a gente mesmo sem muito esforço, conseguia 'pegar' aviú dentro do quintal.
Mas um dia, no anoitecer, a rotina foi quebrada por um barulho estranho de pessoas pulando a cerca e adentrando em nosso 'território' para pescar aviú. Minha mãe, sempre vigilante, deu o alarme. E nós corremos para a varanda do fundo da casa para ver o que estava acontecendo.
E nos deparamos com a turma do Barcuna já se preparando o pano de americano para iniciar a pescaria. Ainda no alto da cerca, franzino, estava ali postado Zé Ronaldo, como a antever que, no futuro, como advogado, estaria diante de uma 'turbação'.
Minha mãe, com seu linguajar de sem muitos rodeios, foi direto ao assunto.
- Podem sair daí seus moleques, esse aviú é nosso.
Surpreendido com o flagra, Barcuna pôs-se em retirada e Zé Ronaldo sumiu dali sem deixar rastro. Mas a turma do Zé Ronaldo sabia como ninguém identificar aonde o aviú se refugiava. Era a campeã desse tipo de pescaria em que se arrasta o pano e cerca o cardume até a beira, deixando-o sem saída.
Por isso a gente tinha a turma do Zé Ronaldo, liderada pelo Barcuna, como 'concorrente’.
Hoje, dezenas de anos se passaram, eu recebo a visita de um vendedor do crustáceo na minha porta e logo em seguida encontro, por acaso, o pescador de aviú do passado a pilotar um belíssimo carro importado como a mesma simplicidade de quando manejava um pano de americano dentro água

           Anônimo disse... 

Que é isso? A grande façanha do Zé Ronaldo - que muito faz jus aos bens materiais e à cultura jurídica que tem - foi quando da palestra ministrada por um pretenso grande jurista nacional, doutrinador cível, que dizia no auditório da ULBRA não haver arbitragem no Brasil. Zé Ronaldo, com sua indefectivel serenidade edarguiu: a arbitragem no Brasil existe sim. Citou o número da lei, falou dos mecanismos da Arbitragem e mostrou ao "ulano de tal" que há juristas também nas plagas do alagado amazônico. Fiquei orgulhosa de ser paraense naquele momento... Mas o "dito cujo", é claro, não perdeu a chance de retrucar a fala de Zé Ronaldo, com argumentos sofistas. Eu acho que o "canela de vidro" saiu com a canela trincada daquele debate, mas não sem arrebentar a unha do dedão do pé do palestrante. Se é exímio pescador de aviú, realmente,não sei, mas que arpoou muito bem o tubarão com plumas do Largo de São Francisco, ah isso fez...
          




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