Artigo publicado na edição de segunda-feira (09),
no jornal Correio do Povo, de Porto Alegre, da lavra do vice-presidente
nacional da OAB, Claudio Lamachia, sobre os problemas na implantação
açodada do Processo Judicial Eletrônico (PJe).
Quando a Receita Federal anunciou que passaria a receber as declarações
de Imposto de Renda pela Internet, tomou uma providência exemplar, pois
deixou que gradativamente o contribuinte se adaptasse ao sistema e o
manteve funcionando em três modalidades diferentes: em papel, por
disquete e pela Internet.
A evolução tecnológica foi levando o
contribuinte a optar pelo modo mais prático, de acordo com a
disponibilidade tecnológica do local em que vive. Foram anos de
adaptação até chegarmos ao sistema atual. Um claro exemplo de boa
prática na gestão pública e de respeito ao cidadão. Infelizmente, a
prudência da Receita Federal não vem sendo seguida pelo Conselho
Nacional de Justiça (CNJ) quando tratamos do processo judicial
eletrônico, e isso pode custar caro para a cidadania brasileira e para
os advogados.
É bom lembrar que o prazo para um advogado não é o
mesmo do contribuinte. Enquanto este tem alguns meses para reunir
documentos e preencher o formulário eletrônico, o advogado tem, na
maioria das vezes, cinco dias para cumprir um prazo. Imaginem que neste
período a cidade em que atua o profissional sofra um apagão de energia
elétrica, ou – ainda mais comum – a Internet banda larga ou 3G
simplesmente não funcionem. A perda de um prazo por razões estruturais
alheias à responsabilidade do advogado pode significar prejuízos sem
precedentes aos cidadãos, como o seu patrimônio e a liberdade.
Pode parecer estranho que no momento em que vivemos a era digital, da
superinformação e da conectividade, tenhamos que questionar se a Justiça
brasileira está efetivamente capacitada para tomar o rumo do processo
judicial sem papel. Porém, como percebemos diariamente, quesitos básicos
para o funcionamento seguro do sistema simplesmente não encontram
estrutura mínima para seu sucesso.
Não se trata de defender o
atraso. A advocacia sabe que o Processo Judicial Eletrônico (PJe) é uma
das ferramentas capazes de minimizar um dos maiores problemas do sistema
judicial brasileiro: a morosidade. No entanto, a experiência vivida até
aqui pelos profissionais tem sido diversa. O que se quer é que, a
exemplo do que foi feito pela Receita Federal com o IR, o Processo
Judicial Eletrônico seja uma opção aos advogados. É fundamental que haja
– para o bem da segurança jurídica — a necessária maturação do sistema e
a unificação da plataforma. O PJe deve ser uma solução, não um
problema.
Enquanto os relatos de instabilidade forem comuns, como
os casos em que advogados ficam impossibilitados de peticionar ao longo
de horas, não podemos aceitar o PJe como única possibilidade. O direito
ao acesso à Justiça é maior e infinitamente mais relevante do que o
meio imposto pelo Judiciário. A cidadania não pode correr o risco de ser
prejudicada pelo atraso estrutural do Brasil na área de
telecomunicações.
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