O inesquecível mestre uruguaio Juan Eduardo
Couture Etcheverry (1904-1956), que a comunidade jurídica internacional
conhece, admira e identifica como Eduardo Couture, Catedrático de
Processo Civil, Decano da Faculdade de Direito de Montevidéu, deixou um notável
patrimônio de trabalhos jurídicos em suas atividades de professor e de
escritor. Merecem destaque Os Mandamentos do Advogado, com inúmeras
edições em castelhano, português e em outros idiomas. Na introdução de uma
delas constam observações acerca do decálogo do dever, da cortesia e da nobreza
da profissão. Em poucas palavras, ele define a advocacia como arte,
política, ética e ação. São suas as palavras adiante na
versão em português do original espanhol pelos juristas Ovídio A. Baptista
da Silva e Carlos Otávio Athayde.[1]
Como arte, a advocacia tem suas regras que, como todas as regras
da arte, não são absolutas, mas, ao contrário, ficam confiadas à inesgotável
aptidão criadora do homem. O Advogado foi feito para o Direito; não o oposto. A
arte de interpretar as leis sustenta-se, acima de tudo, na excelsa dignidade da
matéria confiada às mãos do artista. Como política, a advocacia é
a disciplina da liberdade dentro da ordem. Os conflitos entre o real e o ideal,
entre a liberdade e a autoridade, entre o indivíduo e o poder, constituem tema
de cada dia. Envolvidos por esses conflitos, cada vez mais dramáticos, o
Advogado não é uma simples folha na tempestade. Ao contrário, investido da
autoridade que cria o Direito, ou da defesa que pugna pela sua justa aplicação,
o Advogado é quem desencadeia, muitas vezes, a tempestade e pode contê-la.
Como ética, a advocacia é um exercício constante da
virtude. A tentação passa sete vezes por dia pelo Advogado. Ele pode fazer de
sua missão, como já foi dito, a mais nobre de todas as profissões, ou o mais
vil de todos os ofícios. Como ação, a advocacia é um constante
serviço aos supremos valores que regem a conduta humana. A profissão exige a
permanente serenidade da experiência e do conhecimento dos princípios da
Justiça. Porém, quando a anarquia, o despotismo ou o desprezo pela condição
humana abalam as instituições e ameaçam os direitos individuais, então, a
advocacia é militância na luta pela liberdade. Arte, política,
ética e ação, por sua vez, são apenas a matéria da advocacia, que se
revela mediante uma forma. Como toda arte, possui um estilo. O estilo da
advocacia não é a unidade, mas a diversidade. De modo resumido, são estes os
dez mandamentos do Advogado, expostos pelo imortal Eduardo Couture.
“(1) Estude. O Direito está em constante transformação. Se
não o acompanha você será cada dia menos Advogado. (2) Pense. O
Direito se aprende estudando; porém, se pratica pensando. (3) Trabalhe.
A advocacia é uma fatigante e árdua atividade posta a serviço da Justiça.
(4) Lute. O seu dever é lutar pelo Direito; porém, quando
encontrar o Direito em conflito com a Justiça, lute pela Justiça. (5) Seja
leal. Leal para com o cliente, a quem não deve abandonar a não
ser que perceba que ele é indigno do seu patrocínio. Leal para com o adversário,
ainda quando ele seja desleal consigo. Leal para com o Juiz que ignora os fatos
e deve confiar no que você lhe diz; e que, mesmo quanto ao Direito, às vezes
tem de confiar no que você lhe invoca. (6) Tolere. Tolere a
verdade alheia como gostaria que a sua fosse tolerada. (7) Tenha
paciência. O tempo vinga-se das coisas que se fazem sem a sua
colaboração. (8) Tenha fé. Tenha fé no Direito como o
melhor instrumento para a convivência humana; na Justiça, como o destino
natural do Direito; na paz, como substitutivo benevolente da Justiça; e,
sobretudo, tenha fé na liberdade, sem a qual não há Direito, nem Justiça, nem
paz. (9) Esqueça. A advocacia é uma luta de paixões. Se a cada
batalha for carregando a sua alma de rancor chegará o dia em que a vida será
impossível para você. Terminado o combate esqueça logo tanto a vitória como a
derrota. (10) Ame a sua profissão. Procure
considerar a advocacia de tal maneira que, no dia em que seu filho lhe pedir
conselho sobre o futuro, considere uma honra aconselhá-lo a ser Advogado”.
Como afirma Couture, os mandamentos são “decálogos do dever, da
cortesia e da nobreza da profissão. Querem significar em poucas palavras a
dignidade do ministério do advogado. Ordenam e confortam ao mesmo tempo; mantém
alerta a consciência do dever; procuram ajustar a condição humana do advogado à
missão quase divina da defesa”.
[1]
Os
Mandamentos do Advogado, 3ª ed., Porto Alegre: Sergio Antônio Fabris
Editor, 1987, p.10 e s.
* artigo publicado no jornal "O Estado do Paraná", caderno "Direito e Justiça" de 18.09.2011.
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