PROCESSO N.o 0810696-66.2021.8.14.0000
ÓRGÃO JULGADOR: 2.a TURMA DE DIREITO PÚBLICO
RECURSO: AGRAVO DE INSTRUMENTO
COMARCA: SANTARÉM (6a Vara Cível e Empresarial)
AGRAVANTE: MUNICÍPIO DE SANTARÉM
PROCURADORA DO MUNICÍPIO: PAULA DANIELLE TEIXEIRA LIMA PIAZZA – OAB/PA no 15.197-B
AGRAVADO: RAIMUNDO NONATO SOUSA CASTRO
ADVOGADO: RAIMUNDO NONATO SOUSA CASTRO - OAB no 3829 e OAB/PA 13032 e OAB/DF 60.534
RELATOR: DES. LUIZ GONZAGA DA COSTA NETO
DECISÃO INTERLOCUTÓRIA
Tratam os presentes autos de AGRAVO DE INSTRUMENTO, COM PEDIDO DE EFEITO SUSPENSIVO interposto por MUNICÍPIO DE SANTARÉM contra decisão proferida pelo Juízo da 6a Vara Cível e Empresarial da Comarca de Santarém, nos autos de Ação Popular (n.o 0808982- 15.2021.8.14.0051), proposta por RAIMUNDO NONATO SOUSA CASTRO.
O agravante apresenta inconformismo com a decisão do juízo a quo que deferiu a liminar pleiteada para determinar a imediata suspensão dos atos lesivos ora impugnados, quais sejam, os sepultamentos nos cemitérios Nossa Senhora dos Mártires, São João Batista e São Sebastião/Maruru, sob pena de multa no valor de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais) por sepultamento realizado, até a efetiva regularização da situação apresentada nos autos, em conformidade com a legislação em vigor.
Ainda na mesma decisão, determinou que o requerido providencie, às suas expensas, os sepultamentos, em cemitérios particulares regulares, da população hipossuficiente, enquanto durar a suspensão acima, por ser a atividade prestada pelos cemitérios de caráter essencial e público.
Historiando os fatos, relata que a supracitada ação aduz, de forma genérica, a existência de inúmeras irregularidades praticadas pela Municipalidade na prática lesiva a população em geral, e que a presente visa proteger o patrimônio público e ambiental relacionada ao funcionamento dos cemitérios de Santarém.
Em suas razões, aduz que se trata de um debate sobre dois direitos, o direito sagrado a propriedade, aqui revertida nos jazigos dos cemitérios São João Batista, Nossa Senhora dos Mártires e São Sebastião-Mararu, e o segundo, um suposto direito de regularização ambiental dos cemitérios, firme em um laudo produzido unilateralmente pelo impetrante, que caso
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permaneça os efeitos da medida liminar, causará um prejuízo maios a população local.
Pontua que os referidos cemitérios foram inaugurados no século passado, e o único fato que é verossímil na ação, é de que não comportam novos túmulos, o que a muito tempo já vem acontecendo, eis que são enterrados nos cemitérios retromencionados somente aqueles falecidos que a família detenha um mausoléu, não sendo aberto novas sepulturas; que os cemitérios já estão consolidados e não demonstram nenhuma lesividade a coletividade e por consequência, ao meio ambiente.
Ressalta que o Governo Federal editou e sancionou a Lei Complementar no 173/2020 que limitou severamente gastos públicos dos Estados e Municípios a qual estamos sujeitos, e caso permaneçam os efeitos da liminar discutida, azorragará severamente o frágil e parco erário do Município de Santarém.
Alude, nesse caso, que fica comprovado a inviabilidade econômica de se destinar verbas públicas para a consecução da medida liminar, que caso assim permaneça, causará sérios e graves prejuízos incomensuráveis a toda população santarena, principalmente aqueles que possuem direito adquirido e legal a efetuar o sepultamento de seus entes nos cemitérios públicos da cidade.
Enfatiza o ente agravante que já está adotando medidas para resolver toda celeuma, seja pela possibilidade de regularização da licença ambiental, seja pela apresentação de uma nova área destinada a um novo cemitério municipal, que assim resolverá o objeto da presente ação.
Ressalta que a parte autora se desincumbiu do ônus probante, aventando em sua rasa fundamentação, somente os títulos contidos nos Artigo 300 e seguintes do NCPC, e Artigo 5o da Lei no 4.717/1965, que por si só não tinham e não tem o condão de forma exauriente para concessão da medida liminar como foi determinada.
Aduz, ainda, que o próprio fiscal da lei Ministerial vem acompanhando tal situação desde 2016, instaurando o respectivo Procedimento Administrativo tombado sob o no 005531-031/2016, sobre tais circunstância naquele momento e inobservado qualquer irregularidade, tendo como resultado o seu arquivamento.
Por fim, assevera que deve ser observado o periculum in mora reverso aqui debatido, que no presente caso geraria sérios danos em diversas searas, inclusive social.
Por tais motivos, requer a concessão do efeito suspensivo ao presente recurso a fim de que seja sobrestada a decisão do juízo a quo, e, ao final, o provimento do agravo de instrumento com a reforma da decisão guerreada a fim de que seja concedido prazo razoável e exequível para a Municipalidade promover as adequações objeto da presente ação, bem como o regular funcionamento dos mencionados cemitérios.
É o sucinto relatório.
DECIDO.
Presentes os requisitos de admissibilidade do recurso, conheço.
Para a análise do pedido de efeito suspensivo formulado pelo agravante, necessário se faz observar o que preceituam os artigos 995, parágrafo único e 1.019, I, do NCPC, segundo os quais, devem estar presentes concomitantemente: probabilidade do direito, de modo que deve demonstrar, através das alegações deduzidas em conjunto com os documentos acostados, a possibilidade de que o direito pleiteado exista no caso concreto; e perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo, consubstanciado no reconhecimento de que a demora na definição do
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direito poderá causar dano grave e de difícil reparação ao demandante com um suposto direito violado ou ameaçado de lesão.
Ressalte-se, por oportuno, que o exame da matéria, para o fim da concessão do efeito suspensivo, pela celeridade que lhe é peculiar, dispensa digressão acerca de toda a temática que envolve os fatos, a qual merecerá o devido exame por ocasião do julgamento do mérito recursal.
Analisando as razões recursais, observa-se, neste juízo de cognição sumária, que os argumentos expendidos pelo agravante foram capazes de desconstituir a decisão combatida, pelos motivos a seguir.
Pois bem, o caso em testilha revela a ponderação de interesses envolvendo os bens e valores que aparentemente revelam-se em confronto. Com efeito, vislumbra-se, de um lado, o risco de dano ambiental em razão da ausência de licenciamento de cemitérios que funcionam há décadas e atendem a população do Município de Santarém e, em lado oposto, o risco grave e irreparável que permeia a decisão liminar que proíbe sepultamentos nos cemitérios Nossa Senhora dos Mártires, São João Batista e São Sebastião/Maruru.
Como um dos meios de efetivação do meio ambiente saudável, a Lei Federal no 6.938/81, dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, determina em seu art. 10:
"Art. 10. A construção, instalação, ampliação e funcionamento de estabelecimentos e atividades utilizadoras de recursos ambientais, considerados efetiva e potencialmente poluidores, bem como os capazes, sob qualquer forma, de causar degradação ambiental, dependerão de prévio licenciamento de órgão estadual competente, integrante do Sistema Nacional do Meio Ambiente - SISNAMA, do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis - IBAMA, em caráter supletivo, sem prejuízo de outras licenças exigíveis." (grifamos).
As necrópoles, como a objeto deste recurso, são a toda evidência, malgrado a sua absoluta necessidade, atividades que tem potencialidade de gerar degradação ambiental, além de danos sanitários a nível urbanístico, dependendo o seu funcionamento, portanto, de licenciamento ambiental.
Nesse passo, a regularização ambiental de cemitérios é objeto da Resolução CONAMA 335/2003.
No caso em exame, verifica-se que o Município, segundo informações da Secretaria Municipal de Meio Ambiente (Id. 35519073 dos autos de origem), não há qualquer arquivo registrando o procedimento de licenciamento ambiental dos cemitérios públicos.
Desta forma, tendo restado incontroverso que os cemitérios objeto da demanda operam sem o devido licenciamento ambiental, é imperioso que o município réu regularize o funcionamento dos cemitérios, cessando a omissão administrativa em cumprir o exigido pela legislação, e providenciando o licenciamento ambiental, evitando, assim, riscos de danos ao meio ambiente, e à ordem e salubridade urbanística do Município de Santarém.
Todavia, entendo que, neste momento, o ideal é priorizar a ponderação, ao direito de acesso dos familiares aos locais de sepultamento dos entes queridos, porém sem perder de vista a necessidade de regulamentar a situação apresentada nos autos.
Ante o exposto, com fulcro nos artigos 995, § único e 1.019, I, ambos do NCPC, em atenção ao restrito âmbito de cognição sumária, defiro o pedido de efeito suspensivo para conceder o prazo de 180 (cento e oitenta) dias para regularização das licenças ambientais, em
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conformidade com a legislação em vigor, até o pronunciamento definitivo do Colegiado.
Esclareça-se que a presente decisão tem caráter precário, cujo deferimento do efeito suspensivo ao recurso não configura antecipação do julgamento do mérito da ação, não constitui e nem consolida direito, podendo, perfeitamente, ser alterado posteriormente por decisão colegiada ou mesmo monocrática do relator.
Por fim, determino que:
Intime-se a parte agravada, para que, caso queira, apresente contrarrazões ao presente recurso, também no prazo de 15 (quinze) dias, nos termos do art. 1019, II, do NCPC.
Em seguida, ao Ministério Público para exame e parecer.
Comunique-se ao Juízo a quo, encaminhando-lhe cópia dessa decisão.
Por fim, retornem-me conclusos para ulteriores.
Publique-se. Intime-se.
Servirá a presente decisão, por cópia digitalizada, como MANDADO DE CITAÇÃO/INTIMAÇÃO/NOTIFICAÇÃO.
Belém, 15 de outubro de 2021.
DES. LUIZ GONZAGA DA COSTA NETO Relator
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