quinta-feira, 16 de outubro de 2014

Prisão civil do alimentante – antinomia – prazo máximo: sessenta dias ou três meses?

*Autor: MSc. José Ronaldo Dias Campos (reproduzo o artigo por  interessar aos acadêmicos de Direito) 

 

INTRODUÇÃO:
Causa intriga a incoerência traduzida pelo confronto do §1º, do art. 733 do Código de Processo Civil (Lei nº 5869/73), com o caput do art. 19, da Lei 5.478/68 – Lei de Alimentos – no tocante ao prazo diferenciado estabelecido para a prisão civil nos casos de inadimplência injustificada no pagamento da prestação alimentar.

A doutrina e a jurisprudência pátria, tentando harmonizar a antinomia apontada, mesmo concordando que o manejo da coerção independe da natureza da prestação jurisdicional deferida (definitiva ou provisória), definem prazos diferenciados de segregação de três meses para as decisões fundadas em alimentos provisionais, com base no CPC, que embora subsequente, é lei geral; e de sessenta dias para os alimentos definitivos, numa exegese contraditória e incoerente, já que a lei especial prevalece à geral, não sendo crível, razoável, lógico nem jurídico atribuir-se sanção mais grave ao descumprimento de uma tutela provisória à uma tutela definitiva.

Os magistrados, por sua vez, para não enfrentarem a discussão sobre o controvertido assunto, vêm fixando o prazo máximo de sessenta dias, limite absorvido pelas duas leis, para o cumprimento da prisão civil.

Dito isso, respeitadas as divergências existentes, com vistas a purificar a antinomia apontada, abordar-se-á a incoerência segundo os critérios clássicos indicados pela doutrina universalmente consagrada, consoante o escólio do jusfilósofo Noberto Bobbio, entre outros.

I. UNIDADE E COMPLETUDE DO ORDENAMENTO JURÍDICO
 
O ordenamento jurídico deve constituir-se numa unidade sistêmica, o que não significa dizer que ele seja completo, exauriente, como sendo, que o sistema jurídico não comporte lacunas, nem que nele não existam incoerências normativas ou antinomias, problemas estes que devem ser enfrentados e resolvidos por obra do operador do serviço jurídico, já que o direito é eminentemente interpretativo.

Para Savigny, a solução de todos os problemas surgidos no campo do direito estava nas fontes. Se não houvesse na norma solução para determinada relação conflituosa, como concretamente pode ocorrer, em razão do dinamismo e da complexidade das relações sociopolítico-jurídicas, o direito certamente ditaria solução para o impasse, pelo manejo de suas fontes, porquanto o direito não se resume na norma, nem esta àquele se reduz. Se falta a completude, trata-se de preencher as lacunas por intermédio das fontes. Se falta unidade, cuida-se de eliminar as contradições, purificando o sistema.


Carnelutti, em sua teoria, trata dos problemas conjuntamente. Fala da incompletude por exuberância - das antinomias - cujo remédio é a purificação; e da incompletude por deficiência - lacunas - saneada pela integração.


Explicitando melhor a teoria Carneluttiana: há incompletude por exuberância no caso de antinomias, onde existem mais normas do que deveriam existir (há norma sobrando), cabendo ao intérprete eliminá-las através do critério de purificação; no caso de incompletude por deficiência, para eliminar as lacunas (há menos normas de que deveria), deve o intérprete, ao contrário, acrescentar aquilo que falta.


Para o jusfilósofo Norberto Bobbio, a coerência era uma exigência não uma necessidade, como sendo: a total exclusão das antinomias não é condição necessária para a existência de um ordenamento jurídico. O ordenamento jurídico pode agasalhar normas incompatíveis e nem por isso deixar de existir, cabendo ao intérprete a criteriosa tarefa de eliminá-las.


Para o estudo que se pretende singelamente desenvolver, em que pese o paralelo traçado entre completude e coerência, doravante invoca-se especificamente o instituto da coerência para solucionar a flagrante antinomia reinante entre o § 1º do art. 733, da Lei nº 5.869/73 (Código de Processo Civil), e o art. 19, da Lei nº 5478/68 (Lei de Alimentos), no que tange ao prazo de prisão pelo não pagamento injustificado da prestação alimentícia.


 
II. EXECUÇÃO DE PRESTAÇÃO ALIMENTAR

A excepcionalidade da prisão civil, em caso de inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentar, disciplinada na lei ordinária, finca raiz no art. 5º, LVII, da Constituição Federal, com o escopo de compelir o alimentante recalcitrante ao adimplemento da inadiável e imprescindível prestação a que está obrigado, portanto de natureza coercitiva.


A obrigação de alimentar, decorrente da relação de parentesco, casamento ou união estável, quando tutelada definitiva ou provisoriamente,  mediante sentença ou decisão interlocutória, nos casos de alimentos definitivos, provisórios ou provisionais é passível de execução nos moldes dos arts. 732 a 735 do Código de Processo Civil, enquadrando-se na espécie de execução por quantia certa.


O credor de alimentos, no entanto, pode optar no sentido de que a execução se processe sob o rito do art. 732, ou seja (execução comum, com o manejo da técnica da sub-rogação pela penhora, adjudicação ou arrematação etc.), ou nos termos do art. 733 do CPC – para que o devedor pague em três dias, sob pena de prisão. Dita execução é admissível tanto para alimentos deferidos como tutela provisória (antecipada e cautelar), como definitiva (sentença exauriente de mérito), consoante anotações infra. É bom lembrar que a jurisprudência pátria, de forma uníssona, vem admitindo o manejo da execução de alimentos sob o procedimento do art. 733, que admite a prisão civil, somente com relação as 03 (três) últimas prestações em atraso e as vincendas.


Ensina Humberto Theodoro Júnior[1]: “a execução por quantia certa, com a particularidade do art. 733, aplica-se tanto à sentença condenatória definitiva, como à decisão interlocutória que impõe alimentos provisórios (arts. 732, 733 e 735)”


Continuando, diz ainda o renomado jurista: “Com efeito, a Lei nº 6.014/73, que fez adaptação da lei de alimentos ao Código de Processo Civil, ao tratar da sentença definitiva que julga a ação de alimentos (principal), dispôs que, não sendo possível a averbação em folha de pagamento ‘poderá o credor requerer a execução da sentença na forma dos arts. 732, 733 e 735 do Código de Processo Civil’. Para Moura Bittencourt, o Código atual não dá lugar a dúvidas, sendo certo que ‘a pena de prisão tem lugar para assegurar a prestação alimentícia de qualquer natureza, seja provisional, provisória ou definitiva, originária ou revista’”[2].


A jurisprudência pátria, assente em nossos pretórios, ratifica o posicionamento doutrinário acima colacionado, consoante aresto a seguir transcrito: “A prisão do alimentante, por descumprimento de sua obrigação alimentar, é cabível, quer se trate de alimentos provisórios, quer provisionais, quer definitivos” (in RT 477/115).


Não se tratando de pena, mas de coerção pessoal destinada a atuar no íntimo do executado, para compeli-lo ao cumprimento da obrigação alimentar, que não pode esperar, não possui coerência, ainda porque pacificado em sedes doutrinária e jurisprudencial, se perquirir a natureza da tutela perseguida (definitiva ou provisória), ainda porque a harmonização das duas leis (Alimentos e CPC) leva-se a esta conclusão.


Portanto, entende-se que a coerção pessoal, independentemente da natureza da tutela deferida (definitiva ou provisória), por tratar da mesma questão, não pode estabelecer prazo diferenciado para seu cumprimento, como ocorre com os dispositivos legais apontados.

III. ANTINOMIA – art. 19, caput, da Lei 5.478/68 e art. 733, § 1º da Lei 5.869/73 – CPC

Primeiramente impõe-se determinar categoricamente a antinomia a que se refere:


A Lei de Alimentos nº 5.478, de 25/07/1968, em seu art. 19 disciplina:


O juiz, para instrução da causa, ou na execução da sentença ou do acordo, poderá tomar todas as providências necessárias para seu esclarecimento ou para o cumprimento do julgado ou do acordo, inclusive a decretação da prisão do devedor até 60 (sessenta) dias.

O § 1º do artigo 733 do CPC – Lei nº 5869/73, tratando da mesma matéria preleciona:
 
Se o devedor não pagar, nem se escusar, o juiz decretar-lhe-á a prisão pelo prazo de 1 (um) a 3 (três) meses.

IV. PRISÃO CIVIL – PRAZO DE SEGREGAÇÃO – UM A TRÊS MESES OU 60 DIAS?


Como se depura da leitura dos dispositivos legais colacionados, o prazo da prisão civil pelo inadimplemento injustificado da prestação alimentar difere, constituindo-se numa incoerência jurídica que precisa ser solucionada pelo intérprete. Aqui reside o ponto nevrálgico da questão.


A segregação máxima é de 60 (sessenta) dias ou 03 (três) meses?


Athos Gusmão Carneiro[3], tentando harmonizar o art. 19 da Lei 5.478/68 ao regime do CPC, por obra da Lei 6.014/73, concluiu que na execução de alimentos provisionais o prazo do confinamento era de um a três meses, enquanto no de alimentos definitivos não ultrapassaria a sessenta dias. Já Barbosa Moreira[4], por sua vez, entende derrogado, no particular, o art. 19 caput, última parte, da lei 5478/68.
Ernani Fidélis dos Santos[5], na mesma linha de raciocínio de Athos Gusmão Carneiro, a respeito do tema, preleciona:
 
“O Código de Processo Civil fala em execução de sentença que fixa alimentos provisionais (art. 733). A lei n. 5.478, de 25 de julho de 1968, tem também disposição expressa, facultando ao juiz a fixação de pena de prisão de até sessenta dias (art. 19), o que tem levado ao correto entendimento, inclusive do Supremo Tribunal Federal, de que a execução prevista no Código de Processo Civil é admissível, tanto para alimentos provisórios quanto para definitivos, apenas estabelecendo, para estes, não a prisão de um a três meses, mas de até sessenta dias, ou seja, de um a sessenta dias”.

Seguindo o mesmo entendimento sobre o assunto, assim se reporta Humberto Theodoro Júnior[6]: “O prazo de duração da prisão, todavia, é diferente: na execução da prestação de alimentos provisionais, pode variar de um até três meses (CPC, art. 733, § 1º); e no caso de alimentos definitivos, só poderá ir até o máximo de sessenta dias (Lei nº 5.478/68, art. 19)”.


Venia rogata, razão não assiste aos eminentes juristas: primeiro, porque não é lógico, razoável nem justo aplicar-se coação mais grave nos casos de não pagamento de alimentos provisionais, onde a tutela é provisória, escorada em juízo de probabilidade, de cognição e procedimento sumários, em detrimento dos alimentos definitivos, onde o juízo é de certeza e a cognição exauriente; segundo, porque dita interpretação fere o art. 2º, parágrafo 2º, da LICC, que prevê, em caso de conflito de normas, balizando o tema, a prevalência da lei especial à geral, opinião também proclamada por Yussef Said Cahali[7].
 
V. CRITÉRIOS PARA SOLUÇÃO DAS ANTINOMIAS

Para responder a este questionamento e eliminar a distorção legislativa referenciada, remete-se ao exame dos critérios referidos por Bobbio, como se depreende a seguir:
Como se pode constatar, a antinomia prende-se tão-somente ao prazo da prisão civil, pois a lei não pode definir tempo de segregação diferenciado para o mesmo fato – inadimplência imotivada de pensão alimentícia.


Três são os critérios básicos para a solução das antinomias:


Critério Cronológico (lex posterior) – Entre duas normas incompatíveis, a norma posterior prevalece à anterior. É a regra geral do direito de que a última vontade anula a precedente, como sendo, entre dois atos de vontade da mesma pessoa prevalece o último.


Critério Hierárquico (lex superior) – Sabe-se que as normas possuem uma arrumação
piramidal. Assim, entre duas normas incompatíveis entre si, prevalece a hierarquicamente superior.


Critério de Especialidade (lex especialis) – Havendo incompatibilidade entre uma norma geral e uma especial, prevalece a última. Na incoerência a lei especial anula a lei mais geral, ou subtrai da norma geral parte de seu conteúdo para submetê-la à sua regulamentação.


Em suma, utiliza-se o critério cronológico quando duas normas incompatíveis forem sucessivas (lei velha e lei nova); o hierárquico quando a incompatibilidade ocorre em nível diverso (lei superior e lei inferior) e o critério de especialidade, quando o choque se passa entre uma norma geral e uma norma especial.
 
VI. A ANTINOMIA APONTADA FRENTE AOS CRITÉRIOS

Enfrentando o problema posto, diante dos critérios de solução de incoerência indicados, têm se:


Pelo critério cronológico prevalece o prazo de três meses estabelecido no Código de Processo Civil – lei 5.869/73, com vigência a partir de 01/01/74, já que a lei de alimentos é de 1968, com alterações introduzidas pela Lei nº 6.014/73, em vigor a partir de 31.12.73, que não tocou no caput do art. 19 sub examen.


Problema inexiste quanto ao critério hierárquico, em vista das duas normas serem do mesmo nível –ambas são leis ordinárias.

Com relação ao terceiro critério, como o Código de Processo Civil é uma norma geral, esta cede lugar à lei de alimentos, que por ser especial prevalece, mantendo o prazo máximo da prisão civil em sessenta dias e não em três meses.


Como se depreende da análise supra, depara-se com um conflito de critérios a ser solvido racionalmente.
 
VII. INCOMPATIBILIDADE ENTRE OS CRITÉRIOS

Viu-se que os tradicionais critérios hodiernamente aceitos para a solução das antinomias são o cronológico, hierárquico e o da especialidade. Entretanto, como está a acontecer na situação em comento, podem ocorrer situações em que duas normas incompatíveis mantenham entre si uma relação que envolva a aplicação concomitante de não apenas um, mais dois ou três critérios. Ex.: uma norma constitucional e uma norma ordinária, que geralmente são editadas em tempos diversos, existe entre elas, a um só momento, diferenças hierárquica e cronológica. Se depois, a norma constitucional é geral e a ordinária é especial, como pode ocorrer, já existem três critérios aplicáveis.


Contudo não haverá problema quando se obtém o mesmo resultado, independentemente do critério manejado. Assim, se de duas normas incompatíveis, uma superior e subsequente e outra inferior e antecedente, tanto no critério hierárquico como no cronológico, a solução será a mesma, qual seja, a prevalência da norma superior. O mesmo acontece se a norma subsequente é especial em relação a precedente. Ela prevalece, seja pelo critério da especialidade, seja pelo critério cronológico.


Problema ocorre quando duas normas comportarem a aplicação de dois critérios e estes tiverem solução opostas, como no caso vertente. Como solucioná-lo?


Preliminarmente é bom frisar a impossibilidade de se aplicar concomitantemente dois critérios, devendo o operador do direito, detectando o conflito, priorizar um deles.


Se houver um caso de incompatibilidade entre uma norma constitucional anterior e uma norma ordinária posterior, depara-se com dois critérios a serem aplicados, o hierárquico e o cronológico. Adotando-se o primeiro, dá-se preferência a primeira norma; inclinando- se pelo segundo, aplicar-se-á a segunda norma.
 
VIII. REGRAS PARA SOLUÇÃO DAS INCOMPATIBILIDADES

Para solucionar as incompatibilidades, ditas de segundo grau, entre tais critérios, estabeleceu-se a seguinte regra:


a) conflito entre critério hierárquico e cronológico – norma anterior superior x norma posterior geral. Pelo critério da hierarquia há prevalência da primeira, pelo cronológico, da segunda.


Entretanto, a regra é no sentido de que o critério hierárquico prevalece ao cronológico, o que faz com que a norma inferior seja eliminada, mesmo que posterior.


b) conflito entre o critério da especialidade e o cronológico – norma anterior especial x norma posterior geral. Aplicando-se o critério da especialidade dá-se prioridade à primeira norma; se cronológico, dá-se preferência á segunda. A regra impõe que o critério da especialidade sobreponha-se ao cronológico. A lei geral sucessiva não exclui a lei especial precedente.


c) conflito entre critério hierárquico e o da especialidade – norma superior geral x norma inferior especial. Aplicando-se o critério hierárquico prevalece a primeira; aplicando-se o da especialidade, a segunda. Trata-se de dois critérios relevantes (fortes), considerando-se o cronológico como fraco.


Aqui inexiste regra firmada, ficando a solução a critério do intérprete. Importante destacar que se está diante de dois valores essenciais do ordenamento jurídico, o respeito à ordem, ao poder que exige obediência hierárquica; e o da justiça, que exige adaptação gradual do direito às necessidades sociais, e, portanto, respeito ao critério da especialidade.


A priori, num primeiro momento deve prevalecer o critério hierárquico ao da especialidade, contudo, nem sempre acontece assim. Ex.: princípio constitucional x lei ordinária especial.
 
IX. RESOLUÇÃO DAS ANTINOMIAS

Caso presente, a incompatibilidade de segundo grau, como já apresentada, será resolvida de acordo com a segunda regra (conflito entre o critério da especialidade e o cronológico), em que prevalece a norma especial à geral, independentemente do tempo de validade.


Portanto, sendo o CPC e a Lei de Alimentos leis ordinárias, cuja primeira é geral e a segunda especial, independentemente da lei processual ser posterior, prevalece a Lei de Alimentos, dada sua especialidade.


Assim, forçoso é concluir que o prazo relativo à prisão civil por injustificado atraso no pagamento de prestação alimentícia é o estabelecido na Lei nº 5498/68 – Lei de Alimentos – como sendo 60 (sessenta) dias.
 
X. INSUFICIÊNCIA DE CRITÉRIO

Em caso de insuficiência de critérios, o que inocorre na questão vertente, socorre-se
supletivamente de uma solução extraída da forma da norma, segunda a qual as normas podem ser imperativas, proibitivas e permissivas.


Tal critério consiste em estabelecer gradação de preferência entre as três formas da norma jurídica: se de duas normas incompatíveis, uma é imperativa ou proibitiva e a outra permissiva, prevalece a permissiva (interpretação favorabilis sobre a odiosa).


Dessa forma, em última análise, embora a solução para a antinomia esteja disposta nos critérios examinados ao norte, ainda assim, no choque entre o § 1º do art. 733 do CPC e o caput do art. 9º da Lei de Alimentos, a lei mais favorável é a última que prevê sanção menos gravosa ao executado, justificando ainda mais a prevalência da regra prevista na lei especial à contida na lei geral, da mesma gradação, independentemente da cronologia.


Ademais, não se pode olvidar o limite político, como bem ensina o festejado mestre Cândido Rangel Dinamarco, estabelecido no art. 620 do CPC à execução, a fim de “torná-la tão suportável quanto possível ao devedor e ao seu patrimônio”.


O princípio da execução equilibrada inclina-se no sentido de balancear as diretrizes da máxima utilidade da execução com o menor sacrifício do executado, o que significa dizer, a par da preocupação com a efetividade da execução, deve-se procurar sempre o caminho menos gravoso para o devedor.


Que diferença faz ser preso por 60 (sessenta) dias ou 03 (três) meses para o processo de execução, que é puramente satisfativo, se a simples ameaça ou expedição do mandado prisional já é suficiente para coagir o alimentante ao cumprimento da obrigação. A excepcional segregação do devedor pelo prazo de 60 (sessenta) dias, por si só, já não é por demais severa e execrante?


Destarte, pela criteriosa análise realizada alhures, tem-se convicção que o prazo máximo de aprisionamento expresso na lei de alimentos, por ser especial e menos gravoso ao executado, prevalece à regra geral mais severa estabelecida no CPC.


Assim sendo, harmonizando-se os dispositivos em referência, tem-se que o prazo máximo da prisão civil na obrigação alimentar é de sessenta dias e não de três meses.
CONCLUSÃO

Purificando a lamentável incoerência existente entre o §1º do art. 733 do Código de Ritos e o caput do art. 19, da Lei de alimentos, após minudente análise dos critérios tradicionais indicados pela literatura jurídica para solução das antinomias, chega-se as seguintes conclusões:


O credor de alimentos pode optar pela coerção pessoal, aos moldes do art. 733, §1º, ou pela execução normal, com intimação (art. 475 - J), penhora, hasta pública etc., sendo que a excepcional prisão do alimentante não impede o credor de prosseguir com a execução pelo meio expropriatório.


A segregação do alimentante, que não pode ser decretada ex officio, não passa de um meio de coerção pessoal para forçar o devedor recalcitrante a adimplir a inadiável obrigação alimentar, não tendo sentido distinguir-se a natureza da prestação jurisdicional deferida para tal fim, se definitiva ou provisória.


O prazo máximo de sessenta dias de prisão previsto na Lei de Alimentos, por ser especial e menos gravoso ao executado, prevalece à norma geral codificada, que estabelece o prazo de três meses, estando, portanto, derrogada neste particular.


Notas:
[1] THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil – Processo de Execução e Processo Cautelar. 19. ed. vol. II. Rio de Janeiro: Forense, 1997. p. 267.
[2] THEODORO JÚNIOR, Humberto. Op. Cit. p. 267.
[3] CARNEIRO, Athos Gusmão. Ação de Alimentos e prisão civil. n. 7. P. 68.
[4] MOREIRA, José Carlos Barbosa. Novo Processo Civil Brasileiro. 22. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002. p. 261.
[5] SANTOS, Ernane Fidélis dos. Manual de Direito Processual Civil - Execução e Processo Cautelar. 4. ed. v. 2. São Paulo: Saraiva, 1996. p. 233.
[6] THEODORO JÚNIOR, Humberto. Op. Cit. p. 267.
[7] CAHALI, Yossef Said. Dos Alimentos. p. 639-640.
* Artigo publicado nas Revistas: Prática Jurídica n° 23; Síntese n° 83; Boletim Doutrina Adcoas n° 38; site do gontijo - atualizado em 2012 pelo autor, José Ronaldo Dias Campos.

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