segunda-feira, 14 de novembro de 2011

Advogado fala sobre mudanças no Código Penal


O Dr. José Ronaldo Dias Campos, um dos mais conceituados e renomados advogados do Estado do Pará, foi consultado pela reportagem do Portal na Hora para falar sobre as mudanças no Código Penal, que ainda gera polêmica no meio jurídico. Na oportunidade, José Ronaldo destacou o caso Jader e opinou a respeito do plebiscito sobre a criação dos estados do Tapajós e Carajás, que será realizado no dia 11 de dezembro. Também abordou o escândalo na OAB. Veja a íntegra da breve entrevista:

Portal na Hora: Com a mudança do novo Código de Processo Penal, criou-se uma grande polêmica no meio jurídico brasileiro. Alguns dos mais renomados juristas do país divergem sobre o assunto. Em sua opinião, o que mudou?

José Ronaldo: A alteração introduzida no Código de Processo Penal, concernente à nova lei das prisões cautelares ou processuais, objetivou apenas incorporar à legislação ordinária especifica o comando constitucional vigente, orientada pela interpretação predominante nas cortes superiores de justiça (STF e STJ), de modo que não vejo novidade suficiente a gerar a decantada polêmica no meio jurídico. A respeito do tema, o art. 44 do Código Penal já reconhecia, como direito subjetivo do acusado, muito antes da reforma referenciada, a possibilidade de substituição, pelo juiz, da pena privativa de liberdade por restritiva de direito (alternativa), quando não superior a quatro anos.

Portal na Hora: Quais as principais vantagens?

Imagine alguém, réu primário, a título de exemplificação, preso em flagrante delito ou por força de preventiva, sabedor que ao término do processo, na pior das hipóteses, se condenado for, a pena concreta aplicada não superará a quatro anos de reclusão, obrigando o julgador a convolar em pena alternativa a privativa de liberdade, por força do art. 44 do Código Penal Brasileiro, posto no sistema antes da edição da Lei 12.403/2011. Estar-se-ia prendendo provisoriamente o em tese infrator, para libertá-lo ao final do processo, quando da sentença condenatória. Sem falar na possibilidade de absolvição, tendo em vista o caráter abstrato da ação. Distorção que a lei apagou. O parágrafo único do art. 310 do Código de Processo Penal, da mesma forma, há muito já contemplava a chamada liberdade provisória vinculada, autorizando o juiz, quando ausente qualquer das hipóteses ensejadoras da prisão preventiva, relaxar, sob condição, a prisão em flagrante, de maneira que dita segregação de liberdade antecipada só seria mantida pelo juiz se presentes os motivos justificadores do decreto prisional extremo, de natureza cautelar, excepcional. Com referência às medidas cautelares restritivas de direitos, do mesmo modo, não constituem novidade no sistema, em razão do poder geral de cautela atribuído ao juiz, inerente à própria jurisdição. Quanto ao instituto da fiança, valorizada pela reforma, sua aplicabilidade tornou-se apenas mais abrangente, alargando seu manejo, tanto por obra da autoridade policial que a defere (até quatro anos), como pelo juiz (acima de quatro anos), exceto para os crimes considerados de maior potencial ofensivo, como os hediondos ou equiparados (tráfico de drogas, racismo, tortura etc.), para os quais a restrição permanece.
Dito isso, nada de extraordinário trouxe a oportuna reforma (que apenas reafirmou a vontade do legislador, destacadamente o constitucional), que considero boa por impedir que presos provisórios e primários (sem condenação definitiva) sejam contaminados por moléstias comumente propagadas pelo falido sistema prisional. Prisão antes da condenação, principalmente para os delitos de menor potencial lesivo/ofensivo, sendo o acusado primário e de bons antecedentes, só em casos excepcionais, quando presentes os pressupostos para a decretação da preventiva, nos termos do art. 312 do CPP. Já era assim antes da lei reformista em comento.
Enfim, as medidas que aparentemente estendem liberdade a eventuais infratores primários, por força das novas regras, na realidade permitem, isto sim, maior controle por parte do Estado-juiz aos em tese infratores da norma penal, enquanto pendente o processo.


Portal na Hora: Qual sua opinião sobre os recentes escândalos na OAB do Estado?

José Ronaldo: Creio que as questões internas da Ordem devem ser resolvidas diplomaticamente, altruisticamente, por seus integrantes, exceto se o fato extrapolar sua esfera administrativa, atingindo interesses de terceiros, ou geral, em defesa da credibilidade que a instituição conquistou frente à opinião pública ao longo de décadas. O impasse gerado na Seccional, a meu ver, pela amplitude que tomou, deve ser apurado por meio de regular e isento processo, respeitado ou contraditório, para eventual punição dos responsáveis, se assim restar comprovado nos autos. É o mínimo que se pode esperar de seus diretores compromissados com as causas da Ordem, para repor a nobre instituição à posição de vanguarda que sempre galgou.


Portal na Hora: E no caso Jader, o senhor acha que ele assume o mandato e quando o seu retorno deve acontecer?

José Ronaldo: A Suprema Corte ao declarar, com o voto de desempate do Ministro Luiz Fux, em sessão plenária, a inaplicabilidade da Lei do “Ficha Limpa” (ou suja), ao certame passado (2010), oportunizou uma nova leitura para a questão Jader, tomando como paradigma a decisão ilustrada. Portanto, só nos resta aguardar que o Supremo, nos próximos dias, pacifique definitivamente o impasse, pondo fim ao polêmico assunto, que é de repercussão nacional e exige urgente solução.

Portal na Hora: E o plebiscito para a criação do Estado do Tapajós?

José Ronaldo: O Estado do Tapajós, mais que um sonho, é um objetivo perseguido por todos nós há muitos anos. Na década de 80, quando as regras eram diferentes, pois vivíamos num regime de exceção, ao retornar a Santarém, depois da concluir meu curso superior, participei efetivamente do movimento separatista Pró-tapajós, de modo que sou totalmente favorável a emancipação. Entretanto, para atingirmos esse desiderato, imprescindível sufragarmos o “sim” no plebiscito que se aproxima, sob pena de sepultarmos nosso propósito emancipatório, ou postergarmos por muitas outras tantas décadas este objetivo. Sem resultado favorável no plebiscito não se pode falar em criação de novo Estado-membro, em razão das normas constitucionais vigentes.

Morte e extinção da pena

A questão é complexa: a morte (termo final da personalidade) é causa de extinção da punibilidade do agente. Se o MP [Ministério Público] tem ciência, embora não comprovada, da morte do réu, pode hoje estar debruçado sobre um processo morto, acusando um defunto, perdendo tempo.
A personalidade, direito indisponível, milita como prejudicial ao julgamento de mérito da presente ação penal, sendo que a morte presumida, só se configura, com o instituto da ausência, exceto nos casos de justificação de óbito, quando se comprova a morte, mas não se tem a respectiva certidão cartorial

Poder sem força enfraquece autoridade

Debito a responsabilidade pelas repetidas invasões de terras, que enfeiam nossa cidade, em parte, à inação do Estado.
Primeiro, por não instrumentalizar e cobrar, de forma eficiente, tributo com alíquota progressiva sobre áreas urbanas ociosas, que servem apenas à especulação imobiliária. Segundo, por não manejar mecanismos normativos inibidores da moléstia da posse (turbação ou esbulho), à disposição do julgador no sistema processual.
Embora o esbulho possessório constitua crime, a Polícia Judiciária, tolerante a essa prática reprovável, não instaura o competente inquérito, objetivando preparar futura ação penal por obra do Ministério Público. Ninguém é indiciado, processado, nem punido.
O Poder Judiciário, por sua vez, não maneja as técnicas executivas disponíveis no sistema jurídico para compelir a Polícia Militar (Executivo) a cumprir eficientemente as ordens de reintegração de posse, permitindo o esvaziamento das decisões judiciais, algumas já sob o manto da coisa julgada, em descrédito da própria Justiça.
Assim, sem a força policial necessária ao cumprimento das decisões judiciais, em que pese insistentes requisições de magistrados ao Comando da PM neste sentido, somado à inércia da Polícia Judiciária, que não promove o indiciamento dos invasores, ficam os oportunistas de plantão com autorização branca para novas investidas à propriedade e/ou a posse alheia.
O que adianta o Direito proteger a posse contra eventuais agressões, como nos casos de esbulho, tanto na esfera penal quanto na civil, se os produtores do serviço jurídico não se utilizam dos meios de coerção que o legislador engendrou para reprimir eficientemente essa prática ilícita?
Decisão judicial não satisfeita pela ausência de força estatal suficiente ao seu efetivo cumprimento é água de barrela.
Tenho dito!

Frase do Dia

O simples fato de se responder a um processo criminal, que dura uma eternidade, já se traduz numa sanção, com marcas indeléveis na vida do cidadão, destacadamente quando absolvido ao final.