sábado, 7 de março de 2015

Janot feriu a ética e mostrou ser mais um serviçal do planalto


Carlos Newton - Tribuna da Internet - O comentarista Carlos Vicente, sempre preciso em suas observações, chama atenção para um fato da maior importância e que tem sido desprezado pelo noticiário político. Por que motivo o procurador-geral da República se rebaixou perante o Palácio do Planalto e vazou à presidente Dilma Rousseff a lista de parlamentares, ministros e governadores envolvidos no esquema de corrupção montado pelo PT? – indaga Carlos Vicente.

Realmente, causa muita estranheza. O fato é que essa inconfidência do procurador Rodrigo Janot foi uma atitude vergonhosa, pois ele feriu absurdamente a ética profissional e demonstrou inconcebível subserviência ao Planalto, justamente num momento crucial para a nação, quando o procurador-geral tinha o dever de atuar com altivez, independência e autonomia no exercício da função de chefe do Ministério Público Federal.

Janot jamais poderia ter revelado à presidente Dilma Rousseff informações altamente sigilosas, que tramitam em segredo de Justiça e que ele ainda nem encaminhara ao Supremo Tribunal Federal. Ao agir desta forma, o procurador-geral, sem a menor dúvida, cometeu falta gravíssima e desqualificante, que demonstra seu despreparo para ocupar tão importante cargo na República.

No ato, Janot exibiu um inacreditável servilismo. Na ânsia de agradar à presidente da República, ele simplesmente lhe entregou estratégicas informações que até a noite desta sexta-feira ainda estavam sob segredo de Justiça. E fê-lo prazerosamente, para comunicar que a Procuradoria-Geral da República (ou seja, ele próprio) não iria pedir abertura de inquérito contra a chefe do governo, embora ela esteja citada em diversos depoimentos. Para tanto, a justificativa de Janot foi de que os crimes de responsabilidade ocorreram no mandato passado e a presidente Dilma Rousseff não pode mais ser processada pelo Supremo.

Janot soube citar um dispositivo que, a seu ver, livraria Dilma de processo no Supremo (artigo 86, parágrafo 4º): “O Presidente da República, na vigência de seu mandato, não pode ser responsabilizado por atos estranhos ao exercício de suas funções”. Mas o douto procurador esqueceu de que este dispositivo foi aprovado antes de existir reeleição, está totalmente anacrônico, porque na época da aprovação da Constituição não seria possível prever punição para crimes em mandato anterior. Sem falar que tem redação confusa e colide com a Lei de Improbidade Administrativa.

Além disso, há outro dispositivo que manda o Supremo processar presidente da República por crimes comuns (artigo 102, inciso I, alínea b), como estelionato, receptação ou formação de quadrilha, por exemplo, para citarmos apenas três crimes que podem ser atribuídos a quem participou do esquema da Petrobras. E há também crime eleitoral de usar na campanha o dinheiro da propina, transgressão que motiva cassação de mandato, conforme a tese do jurista Jorge Béja, já exposta aqui na Tribuna da Internet.

Portanto, não faltam argumentos jurídicos para enquadrar a presidente Dilma Rousseff. O que falta é coragem a determinados homens públicos, como o atual procurador-geral Rodrigo Janot, que hoje parece mais preocupado com sua recondução ao cargo e não mede esforços para conseguir esse objetivo.

Basta assinalar que, num mesmo ato, Janot quebrou duplamente a ética da Justiça, porque, ao comunicar a Dilma Rousseff o não enquadramento dela, o procurador também lhe entregou a relação dos 54 envolvidos, quebrando o segredo de Justiça.

Se quisesse agir com um procurador-geral autônomo e independente, o mínimo que Janot deveria ter feito é relatar ao ministro Teori Zavascki que a presidente da República havia sido citada em delações premiadas como envolvida no esquema de corrupção e, portanto, caberia ao Supremo julgar se tais atos foram ou não “estranhos ao exercício de suas funções” e se o parágrafo 4º do art. 86 pode continuar tendo validade após o advento da reeleição.

Este é o papel que se espera de um procurador-geral da República que realmente represente o Ministério Público Federal na defesa dos interesses nacionais e coletivos. Mas Janot agiu como advogado de Dilma Rousseff, é esta a realidade.

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