segunda-feira, 18 de agosto de 2025

O Direito que sonhei

O Direito que estudei e ensinei, erguido sobre os pilares da imparcialidade, da justiça e da equidade, parece, aos poucos, afastar-se do horizonte que um dia idealizei. Sonhei com uma ciência humanizada, voltada a pacificar conflitos, restaurar dignidades e semear justiça.

Na sala de aula, dizia aos alunos que o processo — expressão viva de um drama social — deveria ser bom, breve e barato (a regra dos três Bs – BBB), jamais um labirinto burocrático capaz de sufocar a esperança, como já advertira Franz Kafka. No fórum, acreditava que a palavra empenhada pelo advogado, pelo juiz, pelo Ministério Público e pelo cidadão possuía força ética na busca da verdade.

Mas o tempo, implacável, revelou-me desvios. O formalismo, tantas vezes, suplanta a essência; a astúcia, não raro, sobrepõe-se à verdade; e a ânsia de poder obscurece o sentido do servir.

Ainda assim, não renego o sonho. É nele que reside a centelha de resistência que transmiti às minhas filhas, hoje advogadas: acreditar que o Direito pode reencontrar-se com sua vocação primeira — não a de punir por punir, nem subjugar, mas de compor, equilibrar e libertar.

Talvez a distância entre o Direito que sonhei e o que hoje presencio seja também um chamado: recordar a todos nós — juízes, advogados, promotores, estudantes e cidadãos — que a justiça não se esgota nos códigos, mas pulsa, sobretudo, na consciência e no coração do ser humano.

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